15 de junho de 2009

GASA: O “Think Tank” português

Quando finalmente tive a notícia da atribuição da bolsa já estava inserido no GASA. Posso dizer-vos que, sem o GASA, a YDreams muito provavelmente nunca teria existido. No GASA conheci pessoas brilhantes, como o João Pedro Silva, mais conhecido por Punk, com quem escrevi diversos artigos científicos. No GASA respirava-se confiança, alegria, coragem, liberdade, responsabilidade, espírito de aventura, conhecimento. Definitivamente não era local para pessoas que gostem que lhes digam o que fazer, se queiram manter no seu patamar de conforto, não toleram criticas ou sejam acomodadas.

Não resisto a dar-te um exemplo da mentalidade vigente no GASA.

Após me ter orientado relativamente ao tema da minha tese, o António Câmara deu-me uma grande pilha de livros para ler, versando temas diversos. Estranhei alguns deles pois não me pareciam minimamente relacionados com a área em que era suposto eu trabalhar. Foi então que me foi introduzido mais um conceito que a muita gente poderia parecer algo estranho: a leitura aleatória. Dizia o António que era óptimo ler sobre assuntos diversos, mesmo que parecessem nada ter que ver com a nossa área. E lá estava eu, que iria trabalhar em Interacção Humano-Computador, a ler livros muito interessantes sobre temas como fractais, bloqueios conceptuais ou teatro. Tenho hoje a convicção de que este abrir de horizontes teve um papel fulcral no meu crescimento intelectual. A convicção não, a certeza!

Após milhares de páginas lidas, sou informado pelo meu orientador que deveria publicar um primeiro artigo científico numa conferencia com um nome algo bizarro, CHI, cujo prazo de submissão terminava em Setembro de 1994. Fiquei um pouco preocupado pois nunca tinha escrito nada que se parecesse com um artigo, o mais parecido que tinha feito era o relatório do meu projecto de fim de curso... Mas quando fui investigar o que era afinal a CHI... aí sim, fiquei muito preocupado... tratava-se “apenas” da mais importante conferencia a nível mundial na minha área de investigação, promovida pela respeitada ACM e com uma taxa de aceitação de artigos a rondar os 10%...

Nessa altura senti-me realmente como um equilibrista a andar sobre um cabo suspenso a 20 metros do chão... mas o António lá me ia dizendo, com um ar divertido e no seu tom muito próprio: “don’t worry, be happy”. Lá passei o Verão a ler e a pensar, a tentar imaginar que ideia brilhante me poderia levar a publicar um artigo na CHI...

E eis que depois de voltar de “férias” no sossego de São Brás de Alportel, ao reunir-me com o Punk num animado brainstorming, aparece a tão esperada ideia. O GASA estava nessa altura a iniciar a todo o vapor dois grandes projectos de Realidade Virtual, o Coast e o Virtual Tejo, que tinham como objectivo permitir a exploração e simulação de ecossistemas. Um dos grandes problemas deste tipo de sistemas era como proporcionar uma interacção agradável com o ecossistema virtual a um utilizador equipada com um capacete com ecrãs à frente dos olhos, ligado por fios ao computador, e usando luvas grossas e cheias de fios. A nossa inovadora interface iria equipar o utilizador de uma ferramenta virtual, manipulada através de dois objectos reais, uma grande “caneta” e uma placa de plástico que simularia um vulgar bloco de notas. Qualquer movimento dos objectos reais era replicado pelos correspondentes caneta e bloco virtuais. Assim, o explorador do ecossistema poderia voar pelo ecossistema, como um pássaro, avançar ou recuar no tempo, tomar notas ou seguir um percurso anterior. Chamamos-lhe: BITS – Browsing In Time and Space. E deitámos mãos à obra.

Em Abril de 1995 lá estávamos nós em Denver, Colorado, nos EUA, a apresentar o nosso artigo. Algo nervosos claro, mas muito orgulhosos e cheios de confiança em nós próprios e no fantástico grupo em que estávamos inseridos. Como prémio do nosso “feito” o António dera-nos a possibilidade de passarmos um mês nos EUA, visitando importantes laboratórios em Virgínia Tech, University of Virgínia e na mais prestigiada universidade “técnica” dos EUA, o MIT. Uma viagem inolvidável.

3 comentários:

João Pedro Silva disse...

No GASA também havia uma grande preocupação com a capacidade de comunicar de forma eficaz. Para além do que já foi dito, houve três factores decisivos, a meu ver, para o sucesso do BITS:
- o acrónimo (surgido logo na primeira sessão de brainstorm);
- a ajuda na revisão pelo Kim Vicente, que nos respondia em menos de uma hora (excepto durante os jogos do Benfica), cujo contacto nos tinha sido dado pelo Bill Buxton;
- o trial run no GASA. Os nossos colegas do GASA receberam uma cópia do artigo dias antes de lhes fazermos uma apresentação (no mesmo tempo e com os mesmos slides). Foram frontais, objectivos e directos ao explorar os pontos fracos. Isso permitiu-nos estudar e preparar as respostas. E todas as questões que surgiram nessa sessão foram colocadas depois em Denver.

Tiago Carita disse...

Eu cooperei com o GASA um pouco antes da criação da YD e na altura se bem me lembro era de facto tudo um pouco "louco" mas extremamente aliciante e posso dizer, era um sitio único em Portugal. Era o único sitio que encarava o 3D como futuro :-)
Nessa altura até o Prof. Câmara me arranjou um estágio nas Ilhas baleares no maior laboratório de imagem europeu... por algum motivo que me escapa hoje deixei passar essa oportunidade...

João Lopes disse...

"We build too many walls and not enough bridges." - Isaac Newton